Linfoma

Maria Fernanda


Acompanhei o professor Daniel Lessa em um atendimento clínico de um equino, macho, de 15 anos pesando 400 kg. O proprietário se queixava de uma emaciação progressiva há aproximadamente 30 dias. Quando chegamos no local, vimos que o animal apresentava tumefações em diversas partes do corpo, sendo elas retrobulbares bilateral, costado esquerdo, masseter direito, submandibular próximo ao mento e anterior à cernelha bilateralmente, também. Já tinha sido realizado um tratamento prévio de 7 dias com dexametasona, Bionew e soro ringer lactato, além do animal apresentar exames anteriores, porém recentes de mormo e AIE negativos. Havia um resultado dentro das valores de referência em um hemograma e leucograma anterior, apenas apresentando inversão na relação neutrófilo:linfócito. A bioquímica sérica apresentava valores de ureia, ALT, fosfatase alcalina e proteína total acima dos valores de referência usado pelo laboratório.

Durante o exame físico, foi possível perceber que o animal estava bastante emaciado, em estado quase caquético, temperatura corporal de 38,7°C, frequência cardíaca de 46 bpm e uma frequência respiratória de 20 mrpm. As mucosas do animal estavam normocoradas e úmidas, o seio maxilar esquerdo estava com uma percussão maciça e as massas retrobulbares estavam bem pronunciadas. Além disso, o animal apresentava dor laríngea principalmente do lado direito, tumefação dolorida no masseter direito. Traqueia e pulmões sem alterações dignas de nota. Apresentava discreto aumento de volume bilateralmente na região submandibular, mentoniana e costado esquerdo com dor a palpação nas duas últimas, a tumefação da cernelha estava bastante evidente. Tumefações com aumento de temperatura (exceto as retrobulbares). No masseter e no ligamento nucal havia flutuação à palpação. O paciente também apresentava epífora bilateralmente. A cavidade oral estava em péssimo estado, com presença de odontolitíase, genfivite, dor à manipulação externa da cavidade oral na junção dos pré-molares-molares. Língua apresentava grande cicatriz de corte e desgaste total dos incisivos superiores. Presença também de palatite e disfagia de apreensão e mastigação.

Foi realizado exame ultrassonográfico da tumefação da cernelha, evidenciando bursite no ligamento nucal e aspecto inflamatório sem acúmulo de líquido na tumefação torácica além de acúmulo de líquido no masseter.

Também foi feita endoscopia, revelando uma massa no etimóide semelhante a um hematoma etimoidal.

Diante tudo que foi visto, solicitamos o tratamento da cavidade oral, mudança da alimentação, hemograma/fibrinogênio/proteínas totais e frações, bioquímica renal e hepática, pesquisa de hemocitozoários, citologia da massa retrobulbar e exame para brucelose, doença de Lyme e Leptospirose.

No hemograma havia hiperproteinemia (aumento das proteínas plasmáticas totais e fibrinogênio). Na bioquímica havia aumento da ureia sérica. O animal foi não reativo para doença de Lyme, erlichiose equina, negativo para Babesia caballi e positivo para Babesia equi, negativo para brucelose e reativo para leptospirose. Na citologia aspirativa das massas retrobulbares embora a amostra obtida tenha sido de tecido linfoide, não foi possível concluir o diagnóstico.

Dessa forma iniciou-se o tratamento com tetraciclina por 5 dias EV + 5 dias VO para leptospirose. O fibrinogênio diminuiu e a sorologia para leptospirose teve melhora, mas o animal não apresentou nenhuma melhora clínica.

Pela evolução do quadro e pela não melhora do animal, foi optado pela eutanásia e necropsia para tentar fechar o diagnóstico.

Na macro, revelou-se múltiplos nódulos tumorais de consistência firme de 1-7,5cm de diâmetro na face interna das cavidades abdominal e torácica, musculatura, subcutâneo, região mesentérica, estômago, fígado, rins e coração. Ao corte, coloração branco-amarelada homogênea.

Na micro, revelou-se neoplasia de células redondas de aspecto linfoide, com núcleos aumentados ou indentados e citoplasma moderado infiltrando subcutâneo, musculatura estriada, estômago, coração, rim e espaços portas no fígado.

Foi feito perfil imunohistoquímico, tendo como resultado imunopositividade fraca de células neoplásicas (CD20), imunopositividade de linfócitos de fundo (CD3) e imunonegatividade Kapa e Lâmbda.

Dessa forma, os achados necroscópicos, histopatológicos e perfil imunohistoquímico foi confirmado o diagnóstico de linfoma multicêntrico de células B.

Sobre o Linfoma

É o tipo mais comum de neoplasia do sistema hemolinfático equino. Já foram descritos 4 formas anatômicas - generalizada, intestinal, mediastínica e cutânea, com base no principal local de acometimento. Idade típica 5-10 anos, mas já foi relatado em diversas faixas etárias. Sem predileção de sexo.

Sinais clínicos e achados laboratoriais:

Perda de peso crônica, edema subcutâneo ventral e linfoadenopatia regional, cólica e/ou diarreia. Linfoadenopatia regional é comum mas nem sempre está presente. Manifestações clínicas são altamente variáveis, dependendo do local acometido. Quando é de cavidade torácica: taquipnéia, dispnéia, tosse e derrame pleural. Ainda que massas cutâneas ou oculares possam ser a única manifestação de linfoma, o acometimento simultâneo de alguns órgãos internos não é raro. Os nódulos podem aparecer de repente, permanecer estáticos ou regredir e ressurgir mais tarde. Disfagia, secreção nasal irresponsiva, quemose, ataxia e distensão venosa jugular são encontrados facilmente. Esplenomegalia, linfadenopatia interna ou massas abdominais podem ser palpadas ao exame retal. Progressão dos sinais clínicos por semanas ou meses, embora podem ter início súbito. Achados laboratoriais são altamente variáveis. Embora contagem de linfócitos podem estar normais ou diminuídas, observam-se linfócitos atípicos ou obviamente neoplásicos em esfregaços de sangue periférico em 30-50% dos casos. Pode haver aumento discreto de enzimas hepáticas.

Etiologia:

Sem relatos certeiros da etiologia do linfoma. Sabe-se que os sinais clínicos e as alterações laboratoriais do linfoma em geral se devem à perda da função normal de órgãos e tecidos subsequentes à infiltração por linfócitos ou obstrução física por massas tumorais ou pela geração excessiva de produtos celulares tumorais. A infiltração intestinal extensa por linfócitos neoplásicos produz tipicamente má absorção intestinal.

Diagnóstico:

Exame histológico de uma biopsia de massa tumoral ou de linfonodo acometido é o método mais confiável. Raras as vezes que o diagnóstico é possível em esfregaço de sangue periférico. Em geral, o diagnóstico de linfoma só é possível por laparotomia exploratória ou exame pós-morte. À histopatologia, a morfologia celular neoplásica também é variável, mas a destruição da arquitetura tecidual por uma população de células linfóides ajuda a estabelecer o diagnóstico.

Tratamento:

Em geral, os pacientes se encontram bastante debilitados quando o diagnóstico é feito. Houve relato de melhora transitória nas formas generalizadas após o uso de agentes citotóxicos, imunomoduladores e corticosteróides, mas a resposta a longo prazo é precária. Forma cutânea responde à corticoterapia, mas geralmente recidiva de forma até mais patogênica quando se suspende o tratamento.


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